Richard Sallis é um talentoso músico australiano nascido em Adelaide, cuja carreira é marcada por uma grande versatilidade e uma jornada musical que transita entre colaborações em bandas e projetos solo. Como vocalista, ele liderou a banda The Cameramen que depois viria a se chamar Stock Exchange, além da banda Black Ajax, sempre se destacando no efervescente cenário musical independente da região. A trajetória de Sallis reflete não apenas talento, mas também uma dedicação em explorar novas formas de expressão artística no universo musical.
Após um período de hiato que durou oito anos, em 2025 Sallis está de volta, agora com um trabalho solo, Felix, sem dúvida o seu maior ponto de maturidade na carreira até o momento. O disco apresenta uma coleção de músicas que refletem uma jornada pessoal e artística profunda, misturando composições líricas intensas com arranjos sofisticados que revelam sua evolução como músico e compositor, mostrando alguém que encontrou uma nova voz após anos de pausa.
Experimentando uma sonoridade que vai muito além do que ele havia feito em suas bandas anteriores, há uma forte exploração atmosférica condizentes com as narrativas que exploram questões universais muitas vezes soturnas, mantendo assim, a autenticidade que sempre caracterizou o seu trabalho, oferecendo para o ouvinte tanto profundidade emocional quando uma experiência auditiva rica.
"The Kid Has Gone Missing" é a faixa de abertura e estabelece o tom do álbum com uma introdução etérea de cânticos celestiais envoltos em uma sonoridade atmosférica que permeia toda a música. Essa escolha cria uma experiência imersiva que transporta o ouvinte para um espaço introspectivo desde os primeiros segundos, enquanto aborda a complexidade de lidar com memórias dolorosas e o impacto que elas têm no presente, além da ideia de ter a esperança de que com o tempo seja possível encontrar alguma paz.
“A Song for the Broadcasters” injeta uma energia vibrante no álbum e que cativa desde o início. A faixa se destaca pela inclusão de metais estrategicamente posicionados, que não apenas enriquecem o arranjo, mas também intensificam sua vivacidade, dando a faixa mais eletricidade sonora. Apesar de sua energia contagiante, a canção adota uma abordagem contrastante na sua parte final, entregando uma base mais serena, que inclusive, acho que combina mais com sua letra que em um dos temas está um tom de melancolia e resignação diante da inevitabilidade do envelhecimento.
“The Bill and Dean Orchestra” é uma peça que se destaca por meio de uma performance instrumental rica e detalhada e que faz com que a faixa se torne um dos pontos altos do álbum. Sallis entrega alguns vocais repletos de nuance e emoção. Em determinados pontos, o saxofone injeta uma aura jazzística que eleva a música e acrescenta algumas lindas camadas de sofisticação ao som e que serve como o pano de fundo para um trabalho lírico que ilustra a dificuldade de romper ciclos viciosos e enfrentar os próprios medos.
"My Old Unexpected Friends” começa com uma combinação delicada de elementos elétricos e acústicos, evocando uma sonoridade nostálgica que remete à simplicidade melódica de Johnny Cash, criando por meio desta abordagem inicial uma atmosfera íntima e contemplativa. No entanto, à medida que a bateria entra em cena e dita um novo ritmo, a música se transforma e o arranjo ganha intensidade ao evoluir para um linha emocional. Esse contraste acaba refletindo a profundidade temática que permeia o álbum, ao mesmo tempo que existe uma confissão emocional de um indivíduo preso em um ciclo de autossabotagem e que tenta equilibrar a percepção de seus erros com o desejo de mudança.
“No Time Like the Presente” é um dos pontos culminantes do álbum, oferecendo um arranjo capaz de capturar imediatamente a atenção do ouvinte. Possui uma construção bem articuladas de suas camadas instrumentais e que que vão se expandindo progressivamente. Sallis entrega uns vocais com uma sensação de urgência e elevação emocional que se alinha perfeitamente com a mensagem da música em que há um retrato cru de uma mente atormentada pelo sofrimento e pela perda, onde além disso, também explora os limites da moralidade humana diante de algum trauma causado por alguém.
“Bouncing Masquerade Ball”, com quase onze minutos é a peça mais longa do disco. A faixa mergulha profundamente dentro do universo do post-rock, entregando uma jornada sonora rica em camadas e carregada de dramaticidade. A construção da música é conduzida por texturas atmosféricas que se alternam entre momentos de calma introspectiva e explosões emocionais que convida o ouvinte a se perder em um fluxo instrumental dinâmico e intrincado. Tudo isso, em meio a uma narrativa sombria, mas com momentos de vulnerabilidade que indicam esperança de superação.
“The Kid Has Been Found”, com pouco mais de um minuto, encerra o disco por meio de um coral que de uma maneira extremamente emocional, revisita um tema passado e canta sobre a dor das memórias não desaparecer facilmente, mas com o tempo e a paciência, há esperança de encontrar paz.
Em resumo, Felix é uma obra incrível, repleta de profundidade artística e momentos marcantes que destacam a maturidade criativa de Sallis. No entanto, é um álbum que exige do ouvinte mais do que apenas atenção: ele pede uma conexão emocional genuína. Sua carga emocional é densa, permeada por temas melancólicos que embora belíssimos podem ser nocivos para quem não esteja em um estado mental receptivo.
Não é exatamente um disco para qualquer momento. Para apreciá-lo em sua plenitude, é necessário que o ouvinte esteja em um dia capaz de acolher a intensidade emocional que ele oferece. Caso contrário, o peso da melancolia presente nas músicas pode acabar invadindo os ombros de quem o ouve, transformando o prazer da experiência em um fardo. Ainda assim, para aqueles que se entregam ao universo de Felix no momento certo, ele se revela como um testemunho poderoso da capacidade da música de tocar profundamente a alma.
NOTA: 8,4/10
Gênero: Art Rock, Pop Progressivo
Faixas:
1. The Kid Has Gone Missing - 6:34
2. A Song for the Broadcasters - 5:00
3. The Bill and Dean Orchestra - 7:04
4. My Old Unexpected Friends - 7:10
5. No Time Like the Presente - 6:52
6. Bouncing Masquerade Ball - 10:54
7. The Kid Has Been Found - 1:10
Onde Ouvir: Plataformas de Streamin, Youtube e Bandcamp
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