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sexta-feira, 31 de janeiro de 2025

40 anos de: Hounds of Love - Kate Bush (1985)

                       

Hounds of Love é o quinto disco da cantora, compositora e produtora britânica Kate Bush, sendo muitas vezes considerado sua obra-prima e um marco que representa um retorno brilhante após três anos desde o lançamento do excelente The Dreaming (1982), um álbum experimental e audacioso que apesar de também aclamado pela crítica, teve uma recepção comercial modesta. Com Hounds of Love, Bush não apenas reafirmou seu talento visionário, mas também alcançou um nível de sucesso sem precedentes em sua carreira.

O álbum se destacou por sua abordagem ao equilibrar experimentação artística e acessibilidade pop que acabaria conquistando tanto a crítica especializada quanto o público como um todo. Seu single principal, Running Up That Hill (A Deal with God) se tornou-se um dos maiores clássicos da artista e demonstrou sua habilidade de unir letras introspectivas a uma sonoridade atmosférica e envolvente. 

A estrutura do álbum também reforça sua singularidade ao ser dividido em duas partes distintas, com o lado A – que leva o nome do disco - oferecendo músicas mais diretas e radiofônicas, enquanto que o lado B, intitulado The Ninth Wave traz faixas que juntas geram a suíte conceitual que narra a história de uma pessoa à deriva no mar que luta pela sobrevivência enquanto passa por visões e reflexões. Esse formato narrativo aliado ao uso pioneiro de samplers e uma produção sofisticada fez de Hounds of Love um dos álbuns mais influentes da música pop experimental.

Após o lançamento de The Dreaming, Bush optou por se afastar temporariamente do cenário musical. Em vez de seguir imediatamente para um novo projeto sob a pressão da indústria fonográfica, ela tomou a decisão estratégica de construir seu próprio estúdio de gravação, o Solstice Studios em sua casa na zona rural da Inglaterra. Essa mudança representou um ponto importante em sua carreira, pois lhe proporcionou um nível de liberdade criativa inédito. Livre das restrições impostas pelos estúdios comerciais e das limitações de tempo e orçamento, Bush explorou novas possibilidades sonoras com a calma que nunca pode ter antes. Esse ambiente íntimo e controlado foi fundamental para a concepção de Hounds of Love.

Vale destacar também, que a tecnologia desempenhou um papel essencial na construção do sonora do disco ao permitir que Kate expandisse ainda mais os limites da experimentação musical. Um dos elementos centrais dessa abordagem foi o uso do Fairlight CMI, um dos primeiros sintetizadores digitais equipados com sampler e que revolucionou a maneira como os artistas podiam manipular e integrar sons em suas composições. Para Bush não chegava a ser algo inédito, afinal, ela já havia explorado esse instrumento em The Dreaming, porém, foi em Hounds of Love que ela o utilizou de forma mais requintada. 

O álbum realmente se destaca em como consegue mesclar instrumentos acústicos e eletrônicos ao fundir cordas, percussões tribais e vozes etéreas com camadas sintéticas geradas pelo Fairlight CMI. A oposição que ocorre entre o orgânico e o tecnológico resultou em uma sonoridade envolvente que se tornou uma das marcas registradas do disco. Além disso, Bush também utilizou gravações em fita manipuladas sobrepondo e distorcendo elementos sonoros para alcançar efeitos imersivos.

- Hounds of Love -

"Running Up That Hill (A Deal with God)" é o single principal do disco e um dos maiores sucessos da carreira de Kate Bush, tanto em impacto cultural quanto em desempenho comercial. A música traz uma abordagem poética sobre empatia e compreensão nas relações humanas. A escolha do título original, A Deal with God, foi considerada controversa por algumas gravadoras, levando Bush a acrescentar Running Up That Hill para evitar possíveis restrições comerciais. A faixa se destaca por sua batida hipnótica que se sustenta por uma percussão eletrônica e sintetizadores etéreos que criam uma atmosfera emocionalmente envolvente. O vocal característico de Bush eleva ainda mais a carga dramática da canção, o que a torna uma experiência sonora única. Não tem como deixar de destacar também que apesar de já ser um clássico desde seu lançamento, a música teve um ressurgimento em 2022 quando foi utilizada em uma cena icônica de Stranger Things. 

"Hounds of Love", a faixa-título é uma das músicas mais emblemáticas do disco, tanto pela sua intensidade sonora quanto pela profundidade lírica. A instrumentação é rica e densa, além de ser marcada por uma bateria intensa e que cria uma sensação de urgência, enquanto as cordas adicionam uma dimensão quase cinematográfica à música. A estrutura musical, com suas transições dinâmicas e arranjos complexos reflete perfeitamente o tema central da letra que explora o medo e o desejo que surgem quando se entrega ao amor de forma mais intensa e vulnerável.

"The Big Sky" apresenta um dos momentos mais dinâmicos do álbum. Com um ritmo acelerado, pulsante e uma vibração dançante, a canção reflete a celebração da vastidão do céu e a maravilha da natureza. Kate por meio de sua performance vocal transmite uma sensação de liberdade. O uso de percussão animada e sintetizadores alegres confere à música uma sensação como a de uma observação do céu que convida o ouvinte a refletir sobre as infinitas possibilidades do universo. A letra também tem um tom de introspecção, mas com uma abordagem leve ao capturar a simplicidade e a maravilha de olhar para cima e perceber a vastidão da vida e do mundo natural.

"Mother Stands for Comfort" traz com ela um dos momentos mais atmosféricos do disco ao se desenvolver dentro de uma sonoridade etérea construída por meio de camadas de sintetizadores que criam uma sensação de imersão, quase como se estivéssemos sendo envoltos por um manto de névoa. O ritmo tranquilo e a voz suave de Kate adicionam uma qualidade hipnótica. A letra sugere um relacionamento entre mãe e filho, mas a natureza desse vínculo é ambígua e desconcertante. Embora a mãe seja retratada como um símbolo de conforto e refúgio, algo em sua proteção parece suspeito. Um belo contraste entre melodia serena e tensão emocional. 

"Cloudbusting" é uma das faixas mais emocionais de Hounds of Love, com uma narrativa comovente inspirada na história real de Wilhelm Reich, um psicanalista e cientista controverso, e seu filho Peter. A canção é uma recriação de um momento traumático da infância de Peter quando ele testemunhou seu pai sendo perseguido e preso pelas autoridades, após ser alvo de investigações por suas ideias não convencionais sobre energia e a psique humana. Reich foi preso em 1956 e sua história de perseguição política e científica é o pano de fundo para “Cloudbusting”. O arranjo é lindíssimo e traz um trabalho intenso e dramático de cordas, a bateria é envolvente e há uma excelente força rítmica, enquanto isso, os sintetizadores dão uma qualidade transcendental à música, como se o ouvinte estivesse sendo transportado para dentro da mente de Peter que está imersa em uma realidade de confusão e angústia. 

- The Ninth Wave –

“And Dream of Sheep" já começa a suíte por meio da representação de um momento de exaustão e desespero, onde a protagonista está sozinha no oceano cercada pela escuridão e pelo frio, enquanto estabelece um estado emocional que mostra sua luta entre o desejo de sobreviver e a tentação de se render ao sono. Musicalmente possui uma textura suave que reforça a ideia de um sonho. O arranjo é minimalista e apresenta piano, sintetizadores e vocais quase sussurrados. Essa leveza instrumental cria uma dualidade com a ansiedade da letra e intensifica o contraste entre a esperança e o medo da morte. 

“Under Ice” é uma peça minimalista e sombria construída em torno de cordas sintetizadas. Os acordes criam uma pulsação rítmica irregular e uma instrumentação fria e mecânica que parece querer reforçar a sensação de um ambiente hostil. Aqui Kate canta de uma maneira mais tensa e contida, aumentando dessa forma a dramaticidade da música que liricamente evoca a sensação de aprisionamento e desorientação. A personagem parece sonhar que está patinando sobre um lago congelado, mas logo percebe algo ou alguém preso sob o gelo.

"Waking the Witch" possui uma letra que descreve uma mulher sendo julgada, acusada e condenada como bruxa. A protagonista é interrogada e as palavras que a cercam são ameaçadoras e carregadas de uma sensação de perseguição. Musicalmente começa com um piano calmo e vozes suaves, mas rapidamente se transforma em um caos sonoro com vocais distorcidos, batidas intensas e vozes ameaçadoras que parecem representar inquisidores. Possui uma abordagem fragmentada e experimental, além de mudanças bruscas de ritmo e vocais sobreposto.

"Watching You Without Me" carrega uma atmosfera misteriosa criada por um clima melancólico. A base feita pelos sintetizadores é deliciosa, enquanto a bateria eletrônica minimalista ao fundo traz uma espécie de balanço hipnótico. Os vocais parecem soar ao longe, o que reforça o conceito da letra que tem a ideia de transmitir um profundo senso de frustração e impotência. A narradora parece estar separada de seu amado enquanto o observa sem que ele possa vê-la ou ouvi-la.

"Jig of Life" adota uma musicalidade mais folclórica e celta através de arranjos de violão, uma percussão alegre e uma melodia enérgica que evoca a imagem da clássica festa da terceira classe do Titanic em que o Jack dança com a Rose. Essa sonoridade mais vibrante contrasta com a tensão das faixas anteriores. Kate canta de uma maneira animada e bastante expressiva uma música que carrega uma letra mais otimista ao falar sobre o impulso de viver, de lutar e de se renovar, além de transmitir uma sensação de esperança e de estar prestes a romper com o passado. 

“Hello Earth”, musicalmente é um dos momentos mais épicos do disco. Inicialmente entrega uma sonoridade suave e misteriosa, mas não demora muito e ela se eleva para uma seção orquestral incrível que inclui alguns vocais em coro e belíssimos arranjos de cordas. Os vocais suaves de Bush criam uma sensação de introspecção e solidão, enquanto a instrumentação evoca imensidão e até um pouco de misticismo. Sua letra representa um momento de transcendência e contemplação, onde a protagonista exausta e à beira da morte entra em um estado de quase sonho. 

"The Morning Fog" tem uma sonoridade reconfortante com um ritmo animado e arranjo de piano e cordas que cria uma sensação de serenidade. A melodia é do tipo acolhedora e os vocais de Kate são suaves e delicados quase como um suspiro de alívio. A música traz uma sensação de paz por meio de uma estrutura simples e que encerra a suíte de forma otimista. Diferentemente das faixas anteriores, marcadas pelo desespero, medo e alucinações, "The Morning Fog" traz uma sensação de renascimento e esperança. Após a longa luta contra a morte, a protagonista parece finalmente emergir para a superfície e encontrar a salvação. 

Na época de seu lançamento, Hounds of Love foi recebido com aclamação tanto da crítica quanto do público e consolidou Kate Bush como uma das artistas mais inovadoras de sua geração. O álbum demonstrou não apenas sua habilidade única como compositora e produtora, mas também sua capacidade de equilibrar experimentação e acessibilidade ao criar um trabalho que era simultaneamente ousado e comercialmente viável. 

A prova disso é que o disco estreou diretamente no topo das paradas britânicas, desbancando ninguém mais e ninguém menos que Like a Virgin da Madonna, garantindo a Bush seu segundo álbum número um no Reino Unido. O sucesso foi impulsionado principalmente pelo single "Running Up That Hill (A Deal with God)" e que se tornou um de seus maiores hits. A música não apenas conquistou o público europeu, mas também abriu portas para Bush no mercado estadunidense, onde alcançou posições elevadas na Billboard Hot 100, algo que até então ela não havia conseguido com suas obras anteriores.

Além do desempenho comercial, vale destacar também que o álbum foi celebrado pela crítica por sua produção inovadora, sua fusão de elementos eletrônicos e acústicos e sua abordagem cinematográfica das composições. O lado A do disco, repleto de faixas mais diretas e acessíveis, foi elogiado por sua força melódica e riqueza instrumental, enquanto isso, o lado B impressionou pela ambição conceitual e sua narrativa musical envolvente.

Ao longo dos anos, Hounds of Love só cresceu em prestígio, sendo frequentemente citado como um dos álbuns mais influentes da década de 1980 e um marco na música pop experimental. Seu impacto se estendeu por décadas, inspirando até hoje diversos artistas e resgatando novas gerações de ouvintes, especialmente após o ressurgimento de "Running Up That Hill" nas paradas em 2022 graças à sua inclusão na série Stranger Things. Com isso, o legado do álbum foi ainda mais reforçado, reafirmando sua posição como uma das obras mais visionárias e atemporais da história da música popular. Uma obra-prima. 

NOTA: 10/10

Gênero: Art Pop, Pop Progressivo

Faixas:

- Hounds Of Love -

1. Running Up That Hill - 5:03
2. Hounds Of Love - 3:03
3. The Big Sky - 4:41
4. Mother Stands For Comfort - 3:08
5. Cloudbusting - 5:10

- The Ninth Wave -

6. And Dream Of Sheep - 2:45
7. Under Ice - 2:21
8. Waking The Witch - 4:18
9. Watching You Without Me - 4:07
10. Jig Of Life - 4:04
11. Hello Earth - 6:13
12. The Morning Fog - 2:34

Onde Ouvir: Plataformas de Streaming e Youtube

Limite Acque Sicure - Un'Altra Mano Di Carte (2025)

                       

O Limite Acque Sicure é uma banda italiana de rock progressivo formada em 2005 na cidade de Ferrara. Inicialmente o grupo dedicava-se a interpretar clássicos do rock progressivo, especialmente do Banco del Mutuo Soccorso, banda que é uma influência marcante em seu trabalho. Com o tempo eles consolidaram sua formação e identidade musical, o que resultou em composições próprias que mesclam o espírito aventureiro do rock progressivo clássico com uma abordagem contemporânea. 

Em 2022 a banda lançou seu álbum de estreia autointitulado. Este trabalho apresenta um conceito bem definido ao explorara de maneira profunda temas como transformação, tomada de riscos e evolução, tanto no aspecto humano quanto no campo artístico. A sonoridade do disco é marcada pela diversidade de influências variadas de seus integrantes que abrange desde o metal e o fusion até a música clássica e, claro, o rock progressivo. Destaque para a releitura da suíte “Il Giardino del Mago”, do Banco del Mutuo Soccorso, sendo uma clara homenagem às raízes e às inspirações que moldaram a identidade da banda.

A formação atual é composta por Andrea Chendi nos vocais, Ambra Bianchi na flauta, vocais e harpa, Antonello Giovannelli nos teclados, Luca Trabanelli nas guitarras, Paolo Bolognesi na bateria e Francesco Gigante no baixo. Cada um dos membros carrega consigo uma bagagem musical singular que enriquece a musicalidade da banda com suas influências distintas. Essa diversidade de experiências e estilos se reflete na identidade musical do grupo, resultando em uma fusão dinâmica e expressiva que permeia suas composições.

Un'Altra Mano Di Carte, o mais recente trabalho da banda, é um álbum conceitual que apresenta seis narrativas distintas, cada uma abordando aspectos profundos da condição humana. Através de suas composições o disco explora temas como a maldade inerente ao ser humano, o narcisismo, grandes conquistas ao longo da história e as injustiças sociais que marcaram diferentes épocas. Com uma abordagem lírica e musical envolvente, o disco conduz o ouvinte por um percurso intenso, reflexivo e que destaca a habilidade da banda em combinar complexidade temática com uma sonoridade rica e dinâmica.

"Joker" abre o álbum com uma sonoridade intensa que é impulsionada por um riff poderoso de guitarra e uma seção rítmica firme. A energia inicial dá lugar a um momento mais contido quando os vocais, claramente influenciados pelo Gentle Giant, entram em cena e trazem nuances sofisticadas à composição. Um dos pontos altos da faixa é o trabalho de cravo que adiciona uma atmosfera vibrante com suas linhas otimistas, contrastando com o piano que assume um tom mais sombrio durante a pausa que acompanha o coro. À medida que a música se aproxima do final a instrumentação se torna cada vez mais sinfônica. 

"Il Racconto Di Juan Della Sua Terra" é uma obra que respira a essência da escola progressiva italiana. A composição mescla de maneira hábil elementos de música medieval, folclórica italiana e rock progressivo, criando assim uma atmosfera sônica multifacetada. O grande trunfo dessa peça está no trabalho coletivo da banda, onde cada instrumento se encaixa perfeitamente, desde as guitarras precisas e a bateria técnica até as linhas profundas de baixo. Os teclados sinfônicos adicionam uma camada de grandiosidade, enquanto o vocal evocativo guia a narrativa e traz uma carga emocional que se entrelaça com a complexidade da composição. 

"Natale 1914" é uma peça inspirada no primeiro Natal da Primeira Guerra Mundial. Um dos grandes destaques da música é a performance de Ambra Bianchi, que em momentos pontuais, com seu canto soprano confere à faixa um toque etéreo e celestial. A música se alterna entre passagens mais taciturnas e linhas mais edificantes. A alternância de atmosferas do sombrio ao sublime torna essa uma peça emotiva e refletiva que captura a essência do contraste vivido pelos soldados e civis durante um período histórico tão marcante.

"Non Il Bergerac" tem um início marcado por um estudo para piano bastante sofisticado. Em seguida a peça ganha ainda mais profundidade com a entrada dos vocais emotivos que conduzem a melodia com muita sensibilidade. À medida que a música se desenvolve o arranjo se expande e incorpora todos os instrumentos em uma construção sonora belíssima. Embora a seção rítmica seja sólida e as guitarras se encaixem de forma precisa – incluindo um belo solo -, o teclado é o destaque ao adicionar camadas sinfônicas e uma atmosfera grandiosa à composição. Outro ponto alto é a participação de Ambra Bianchi nos vocais de apoio que enriquecem a carga emocional da música. 

"Chita" traz Ambra Bianchi nos vocais conduzindo a narrativa comovente de uma música que aborda a luta pela emancipação feminina e o sofrimento prolongado das mulheres que são frequentemente tratadas como cidadãs de segunda classe ao longo da história. Sua interpretação reforça o impacto emocional da letra. A instrumentação é construída com equilíbrio e sensibilidade, onde piano e guitarra se entrelaçam brilhantemente e mantem a fluidez da peça. Enquanto isso,  baixo e bateria se apresenta de maneira envolvente e criam uma estrutura firme que sustenta todo o arranjo. No final, Ambra ainda dá uma verdadeira aula de canto que remete a ninguém menos que Clare Torry e sua performance emblemática em “The Great Gig in the Sky” do Pink Floyd. Sem dúvida, uma composição poderosa e emotiva.

"Storie Perdute" encerra o álbum com uma sonoridade progressiva poderosa repleta de vigor e paixão. A faixa se destaca pela sua dinâmica bem direcionada que se alterna com maestria entre momentos de força e outros atmosféricos. A seção rítmica ancorada pelo baixo e pela bateria novamente se apresenta bastante enérgica ao construir uma base sólida e pulsante. A guitarra se mostra expressiva e marcante ao adicionar camadas de profundidade à composição. O trabalho dos teclados, seja por meio de órgão, Mellotron ou sintetizadores, cria paredes sonoras que ajudam a ilustrar uma aura quase etérea da peça. 

Un'Altra Mano Di Carte é uma obra que encapsula toda a essência do rock progressivo italiano ao combinar sofisticação instrumental, riqueza melódica e temáticas profundas. O disco transita entre momentos de maior intensidade e passagens mais atmosféricas e reflexivas, mas sempre com uma construção sonora detalhada e bem direcionada. A banda demonstra um domínio técnico impressionante ao criar arranjos que valorizam tanto o virtuosismo individual quanto o trabalho coletivo. A seção rítmica é poderosa e dinâmica, fornecendo uma base sólida para guitarras expressivas e teclados exuberantes, que vão do cravo e órgão ao Mellotron.

Os vocais alternam entre interpretações emotivas e passagens mais etéreas, com Andrea Chendi transmitindo profundidade e sensibilidade em suas performances, enquanto Ambra Bianchi adiciona um toque celestial com sua voz soprano e contribui para a harmonizações que eleva ainda mais o impacto emocional do álbum. Resumindo, Un'Altra Mano Di Carte é um trabalho sofisticado e musicalmente envolvente que consolida a Limite Acque Sicure como uma banda que honra as tradições do rock progressivo italiano ao mesmo tempo em que imprime sua própria personalidade.

NOTA: 9,7/10

Gênero: Rock Progressivo

Faixas:

1. Joker - 8:35
2. Il Racconto Di Juan Della Sua Terra - 7:20
3. Natale 1914 - 10:13
4. Non Il Bergerac - 8:02
5. Chita - 8:56
6. Storie Perdute - 8:14

Onde Ouvir: Youtube

quinta-feira, 30 de janeiro de 2025

50 anos de: Voyage of the Acolyte - Steve Hackett (1975)


Steve Hackett é o tipo de guitarrista que cativa qualquer apreciador de um toque refinado e elegante nas seis cordas. Mais do que ser lembrado – ou, para alguns, conhecido – como o ex-guitarrista do Genesis, Hackett merece ser celebrado por sua brilhante trajetória solo que foi construída sobre uma base de qualidade excepcional e versatilidade impressionante.

Sem jamais se prender a rótulos, o guitarrista transita com naturalidade por uma ampla gama de estilos sempre imprimindo sua identidade única independentemente do gênero que explora. Seja no jazz-rock, pop, rock progressivo, música brasileira, blues, violão clássico ou até na música erudita, sua abordagem é sempre sofisticada e inspiradora. No fim das contas, para Steve Hackett pouco importa o território musical que escolhe desbravar — onde quer que esteja, sua música floresce de uma forma inconfundível.

Voyage of the Acolyte não é apenas o seu primeiro álbum solo, mas também a primeira incursão solo de qualquer membro do Genesis. Com um forte caráter progressivo e experimental, o disco revela a identidade musical distinta de Hackett, tanto como compositor quanto como guitarrista. Suas faixas exploram uma rica tapeçaria sonora, entrelaçando várias de suas influências.

Durante sua passagem pelo Genesis, já se destacava por uma abordagem inovadora da guitarra ao introduzir técnicas como tapping e volume swells, além do uso sofisticado de texturas e efeitos que ampliavam a paisagem sonora da banda. No entanto, dentro do grupo ele frequentemente sentia que suas ideias não eram plenamente aproveitadas. Foi nesse contexto que Voyage of the Acolyte surgiu como uma oportunidade para Hackett expandir sua criatividade sem amarras, permitindo-lhe desenvolver sua própria visão musical de maneira mais ampla e pessoal. O álbum não apenas reafirmou seu talento como compositor e instrumentista, mas também marcou o início de uma jornada solo repleta de experimentação e originalidade.

A principal inspiração por trás de Voyage of the Acolyte veio do tarô, uma influência que se manifesta tanto nas letras quanto na atmosfera envolvente das músicas. Cada faixa remete a um arcano maior e tece uma narrativa simbólica que reflete a jornada humana através do mistério e da descoberta. Essa temática mística permeia toda a obra, o que lhe dá um caráter quase ritualístico. O próprio título do álbum evoca a trajetória do "acólito", um aprendiz espiritual que busca sabedoria e evolução por meio das experiências da vida.

A sonoridade de Voyage of the Acolyte é uma fusão de rock progressivo com influências sinfônicas e folk que são enriquecidas por toques eletrônicos e elementos experimentais. O álbum destaca-se por sua construção cuidadosa de texturas sonoras, sendo esse, um dos maiores trunfos de Steve Hackett tanto como guitarrista quanto como arranjador. Sua abordagem sonora perfeita incorporou efeitos atmosféricos e gravações em camadas, além de uma estética quase cinematográfica na estrutura das faixas. 

O álbum se inicia com "Ace of Wands", uma faixa eletrizante que prende o ouvinte desde os primeiros segundos e marca a sua identidade com uma guitarra vibrante e complexa – um verdadeiro cartão de visitas do estilo de Hackett. A energia da música é impulsionada pela excelente bateria de Phil Collins, enquanto John Hackett adiciona uma camada extra de intensidade com sua flauta executada de maneira agressiva e dinâmica. Uma composição repleta de mudanças de andamento, soar de sinos e passagens de guitarra que transitam entre o virtuosismo e a sensibilidade melódica. Mais do que apenas a faixa de abertura, "Ace of Wands" também marca o início de uma carreira brilhante e duradoura. 

"Hands of the Priestess Part I" é uma peça etérea e envolvente conduzida por uma flauta delicada e expressiva que imprime uma atmosfera encantadora. A guitarra de Hackett com seu tom misterioso e levemente assombrado evoca paisagens sonoras que ele ajudou a construir durante sua passagem pelo Genesis, porém, aqui ganha uma nova abordagem ao soar como algo mais pessoal e expansivo. O resultado é uma composição de beleza hipnótica com cada nota parecendo estar flutuando no.

"A Tower Struck Down" é uma das faixas mais intensas e sombrias do álbum, mergulhando em uma sonoridade agressiva quase caótica. A poderosa base rítmica é ancorada por Mike Rutherford, que entrega uma linha de baixo robusta e sendo reforçada ainda mais pela presença de Percy Jones em um segundo baixo. Hackett explora tons ásperos e atmosferas densas enquanto a faixa evolui de forma imprevisível. Em determinado momento, a composição se transforma em uma paisagem sonora inquietante, onde camadas de guitarras se fundem a uma multidão gritando, explosões e efeitos abstratos, criando um verdadeiro clímax de tensão. 

"Hands of the Priestess Part II" aprofunda ainda mais a atmosfera etérea introduzida na primeira parte ao trazer uma sonoridade ainda mais suave e delicada. Os teclados adicionam uma sutil luminosidade ao tom melancólico e sombrio do álbum, equilibrando mistério e tristeza sem dissipar completamente a aura introspectiva da composição. Embora tenha somente pouco mais de um minuto e meio, funciona como um complemento perfeito para a Parte I, encerrando-a com elegância e coesão. 

"The Hermit" traz uma sonoridade suave e melancólica, mas com algo que era novidade na época, o vocal de Steve Hackett, que inclusive se revela surpreendentemente competente e emotivo, acrescentando uma camada adicional de profundidade à música. Uma voz sutil e introspectiva que se se entrelaça perfeitamente com a guitarra que continua a impressionar com sua habilidade única de transmitir vários sentimentos. O título da faixa evoca a imagem de um eremita solitário, enquanto a música com sua atmosfera etérea remete a um tipo de conto de fadas sombrio. É possível perceber algo no som dessa peça que antecipa a essência de A Trick of the Tail.

"Star of Sirius" é uma das faixas mais complexas e dinâmicas do disco, começando de forma suave, mas logo se transformando em uma montanha-russa sonora. Os vocais de Phil Collins brilham como nunca, talvez porque ele esteja se expressando de forma autêntica, sem tentar emular o estilo de Peter Gabriel. Sua performance aqui é íntima e poderosa e traz uma nova camada de humanidade à música. A transição para um estilo mais jazzy e violento é abrupta, marcada pelo teclado que prepara o terreno para uma nova direção sonora. A guitarra de Hackett que constrói uma parede de som imponente encaixa-se perfeitamente nesse novo contexto ao criar uma tensão crescente. A faixa então se desvia novamente, agora adotando uma sonoridade mais suave onde os teclados e flautas se combinam de maneira extremamente harmoniosa antes de nos levar a uma complexa seção de bateria, Mellotron e mais uma vez a guitarra de Steve.

"The Lovers" é uma breve e suave faixa acústica que oferece um merecido descanso após a complexidade vibrante de "Star of Sirius". Com sua simplicidade delicada a música cria um espaço de reflexão e proporciona um alívio de intensidade e que serve como uma ponte emocional que prepara o terreno para o clímax final do álbum

O álbum se encerra de maneira apoteótica com "Shadow of the Hierophant", um verdadeiro épico que é a culminação de tudo o que foi construído ao longo do disco. A música começa suavemente com os vocais etéreos e cristalinos de Sally Oldfield que conduz o ouvinte por variações musicais intrincadas, ora delicadas e ora poderosas. Sua voz com sua qualidade única cria uma jornada sensorial que se desenrola de maneira quase mágica.

À medida que a música avança, uma passagem instrumental dramática interrompe a voz de Sally pela primeira vez, oferecendo um contraste que prepara o terreno para as próximas transformações. Essa alternância entre os vocais e a instrumentação se repete em momentos distintos, até que em um pico quase psicodélico, toda a banda se junta em uma explosão sonora que leva a música a um novo nível de intensidade.

O ponto de virada chega quando Steve Hackett introduz uma mudança de andamento, conduzindo a faixa para sua seção final, onde a complexidade se desdobra em uma sequência de atmosferas que se alternam e se complementam de uma maneira impecável. O clímax do álbum é de uma dramaticidade impressionante, com a guitarra de Hackett e seu estilo único se misturando ao Mellotron, sinos e o restante da banda, criando desta forma um dos finais de música mais emotivamente espetaculares que conheço. 

Ao longo de cinco décadas de uma prolífica carreira solo, Steve Hackett presenteou o universo da música com inúmeros álbuns de altíssima qualidade, cada um refletindo sua criatividade inesgotável e sua habilidade ímpar como compositor e instrumentista. No entanto, nenhum deles conseguiu alcançar a perfeição singular de seu álbum de estreia. Voyage of the Acolyte permanece uma obra-prima insuperável, um trabalho que transcende o tempo e continua a ser uma referência dentro do rock progressivo. Sua musicalidade é refinada, requintada e de extremo bom gosto, sendo executada por músicos excepcionais que ajudaram a dar vida a uma visão artística única.

Mais do que apenas um grande disco, Voyage of the Acolyte representa um marco na história do gênero, sendo também um testemunho do talento de Hackett e de sua capacidade de criar atmosferas sonoras envolventes e repletas de emoção. Um trabalho magistral do mais prolífico músico solo a emergir de uma das maiores bandas de rock progressivo dos anos 70.

NOTA: 10/10

Gênero: Rock Progressivo

Faixas:

1. Ace of Wands - 5:23
2. Hands of the Priestess, Part I - 3:28
3. A Tower Struck Down - 4:53
4. Hands of the Priestess, Part II - 1:31
5. The Hermit - 4:49
6. Star of Sirius - 7:08
7. The Lovers - 1:50
8. Shadow of the Hierophant - 11:44

Onde Ouvir: Plataformas de Streaming e Youtube

House Of Lords - Full Tilt Overdrive (2024)


O House Of Lords retorna em grande estilo com Full Tilt Overdrive, seu décimo quarto álbum de estúdio, provando mais uma vez que a banda é sinônimo de consistência e qualidade no hard rock. Liderados pelo icônico vocalista e produtor James Christian, o grupo entrega um disco enérgico e impecavelmente produzido, repleto de faixas memoráveis que reafirmam seu status como uma das forças mais resilientes do gênero.

Desde sua estreia homônima em 1988, o House Of Lords consolidou uma base de fãs leal e uma reputação sólida como uma banda que combina melodia, poder e sofisticação. A formação atual conta com James Christian (vocais e baixo), o virtuoso guitarrista Jimi Bell, o tecladista e compositor Mark Mangold e o baterista Johan Koleberg. Juntos, esses músicos criaram um trabalho coeso e inspirado, dando continuidade ao legado da banda sem perder a relevância.

O disco abre com a intensa "Crowded Room", que dá o tom do álbum com sua pegada agressiva e riffs poderosos. Na sequência, "Bad Karma" se destaca como um single irresistível, com um refrão pegajoso e um solo espetacular de Jimi Bell. A faixa-título, "Full Tilt Overdrive", é uma explosão de energia, impulsionada por guitarras incendiárias e uma performance vocal de tirar o fôlego.

Outro momento marcante é "Taking The Fall", uma balada de estrutura impecável que remete ao estilo de bandas como Gotthard, com sua melodia envolvente e um toque emotivo que cativa instantaneamente. Já "Not The Enemy" combina peso e melodia de maneira brilhante, enquanto os teclados de Mangold adicionam uma profundidade única à faixa.

O álbum também se aventura em territórios menos convencionais com "You're Cursed", que começa com um clima cinematográfico antes de explodir em um hard rock vibrante, e "State of Emergency", que aborda temas sociais com uma combinação de letras impactantes e uma base instrumental poderosa. O encerramento épico fica por conta de "Castles High", uma faixa de quase 10 minutos que transporta o ouvinte para uma narrativa quase fantástica, culminando em um clímax musical memorável.

A produção cristalina, a cargo de James Christian e Mark Mangold, merece elogios. Cada instrumento encontra seu espaço na mixagem, permitindo que os detalhes das composições sejam apreciados. Os solos de guitarra de Jimi Bell, em especial, são um show à parte, demonstrando técnica e emoção em igual medida. E a voz de Christian é simplesmente perfeita para o som da banda.

Full Tilt Overdrive foi lançado no Brasil pela Shinigami Records, facilitando o acesso dos fãs brasileiros a este trabalho incrível. Para os amantes do hard rock, este é um álbum essencial que mantém viva a chama do House Of Lords e reforça sua posição como uma das grandes bandas do gênero. Indispensável!

NOTA: 9/10

Gênero: Hard Rock

Faixas:
1. Crowded Room (4:45)
2. Bad Karma (4:11)
3. Cry Of The Wicked (5:09)
4. Full Tilt Overdrive (4:57)
5. Taking The Fall (4:29)
6. You're Cursed (5:34)
7. Not The Enemy (4:09)
8. Don't Wanna Say Goodbye (4:01)
9. Still Believe (4:37)
10. State Of Emergency (4:47)
11. Castles High (9:25)

Onde Ouvir: Plataformas de Streaming e mídia física através da Shinigami Records.

Viima - Väistyy Mielen Yö (2024)

                       

A banda finlandesa Viima retornou de um longo hiato de 15 anos com o álbum Väistyy Mielen Yö, marcando o seu renascimento na cena do rock progressivo. Após o lançamento de dois discos em 2006 e 2009 a banda desapareceu sem dar pistas de um possível retorno e deixou na cabeça daqueles que a acompanharam na época uma incerteza sobre o futuro. No entanto, em 2024 eles surpreenderam a todos com o que é sem dúvida o seu trabalho mais refinado até hoje.

A formação do quinteto é praticamente a mesma de 15 anos atrás, com Hannu Hiltula (flauta, teclados, vocal e backing vocals), Mikko Uusi-Oukari (guitarras e Mellotron), Mikko Väärälä (bateria, vocal, teclados e sinos) e Aapo Honkanen (baixo). A única mudança significativa foi a entrada de Risto Pahlama (vocal, teclados e Mellotron), substituindo Kimmo Lähteenmäki nos teclados. Mesmo tendo saído da banda, Lähteenmäki ainda faz uma participação especial na faixa "Vuoren Rauha."

Väistyy Mielen Yö é composto por cinco faixas que demonstram uma maturidade musical impressionante ao combinar elementos sinfônicos com incursões jazzísticas e toques de folk, além de referências à música clássica. A banda se destaca por soar sempre fresca e inovadora, evitando uma sonoridade repetitiva ou derivativa. É claro que influências de bandas como Camel, Genesis e Jethro Tull, assim como dos conterrâneos Tabula Rasa e Scapa Flow, são perceptíveis, mas a banda consegue incorporar essas referências sem comprometer sua originalidade.

A primeira faixa, "Tyttö Trapetsilla", é uma peça compacta e melódica com destaque para os temas de flauta, violão e guitarra solo. A seção rítmica e as inserções pontuais de órgão também contribuem para a atmosfera animadora do início do álbum. "Äiti Maan lapset" é uma suíte de quase 19 minutos que se desenvolve de forma coesa se alternando entre passagens serenas e momentos mais intensos, porém, sem exageros. A peça se destaca pelas camadas de teclados, linhas compactas de baixo, guitarras robustas e um vocal adequado que complementa a rica instrumentação.

"Pitkät Jäähyväiset" começa com uma flauta delicada e notas de teclado antes de evoluir para o tema central que é marcado por uma batida envolvente. A música ganha peso à medida que avança com riffs de guitarra intensos e uma seção rítmica pulsante que culmina em uma atmosfera psicodélica criada pelos teclados. "Perhonen" é um dos destaques do álbum, começando de forma hipnotizante e crescendo em intensidade até alcançar um momento mais pesado, com bateria e baixo em destaque, enquanto a guitarra e o teclado criam um clima sinfônico e atraente. "Vuoren Rauha" é a última faixa do álbum, inicia com sons de vento criados por Kimmo Lähteenmäki, seguidos por uma serena combinação de piano e voz. A música evolui com a entrada da bateria e do Mellotron que conferem um caráter épico à peça que tem seu clímax em um solo de órgão e termina de forma sutil com sons de vento e uma voz distante.

Väistyy Mielen Yö é um trabalho coeso, onde os músicos atuam como um conjunto sem protagonismos, mas com uma pluralidade harmoniosa que mantém a banda bem direcionada em suas inúmeras ideias. Para os interessados, as letras das músicas estão disponíveis em inglês no site oficial da banda, viima.org, oferecendo uma experiência ainda mais completa para os fãs de rock progressivo.

NOTA: 9,4/10

Gênero: Rock Progressivo, Folk Rock

Faixas:

1. Tyttö Trapetsilla (4:42)
2. Äiti Maan Lapset (18:50)
3. Pitkät Jäähyväiset (6:38)
4. Perhonen (6:45)
5. Vuoren Rauha (7:37)

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quarta-feira, 29 de janeiro de 2025

Pearl Jam - Dark Matter (2024)

                        

Ao mencionar o Pearl Jame estou evocando o ponto de partida da minha relação profunda com o mundo do rock. Remonto a um momento marcante de 1992 quando me deparei com o videoclipe de Jeremy. Aquela narrativa visual culminando em um desfecho poderoso foi como uma revelação para mim, despertando um interesse imediato e visceral pelo grupo. Foi um momento crucial onde minha conexão com a música e a expressão artística atingiu um novo patamar.

Nos meses seguintes, fui cativado ainda mais pela presença do Pearl Jam quando a MTV exibiu a icônica performance de Porch no Pinkpop. A energia, paixão e a autenticidade da banda eram palpáveis e eu me vi totalmente absorvido pela experiência musical. Logo depois, o Unplugged MTV me ofereceu uma perspectiva mais íntima e crua da musicalidade do grupo, consolidando ainda mais minha admiração.

Dark Matter chega como o 12º disco de estúdio da banda – o que considero pouco para uma carreira discográfica de 33 anos. Mas de qualquer forma – e o mais importante de tudo -, eles parecem querer continuar soando relevantes ao entregar um disco cheio de dinamismo, frescor e de uma sonoridade que mantém sua música envolvente durante todos os seus cerca de 48 minutos divididos em 11 canções. Apenas um adento, se você é daquelas pessoas que até hoje evocam discos como Ten ou VS para comparar com álbuns mais recentes da banda, não sei o que o que você faz ouvindo-os ainda, agora se você compreende o que é o Pearl Jam hoje em dia, certamente Dark Matter vai atingi-lo da melhor forma possível.

"Scared Of Fear" abre o disco entregando uma vibração clássica da banda, vocais enérgicos, guitarras cativantes e uma seção rítmica sólida, precisa e sincronizada que sustenta o ritmo da faixa muito bem. "React, Respond" mantém o disco dentro de uma sonoridade de alta voltagem, com refrão chiclete e uma linha instrumental maciça. A faixa captura a energia crua da banda, combinando riffs intensos e ritmos pulsantes. "Wreckage" é uma balada que se destaca no álbum por seu estilo emocional e envolvente. Por meio de sua estrutura estilística a música parece prestar homenagem a Tom Petty ao incorporar elementos de sua abordagem distinta à composição e à performance.

"Dark Matter" é uma das peças mais pesadas do álbum. Seção rítmica penetrante, riffs encorpados de guitarra e um solo ao melhor estilo Mick McCready, um cara que nunca foi um “guitar hero”, porém, sempre entendeu bem o que é necessário pra soar marcante dentro da banda. "Won't Tell" é outra balada do álbum que embora não seja tão impactante quanto "Wreckage", ainda oferece uma experiência de qualidade. A faixa se destaca por sua batida constante e envolvente, proporcionando uma base sólida. É enriquecida com o acréscimo de alguns leves toques de sintetizadores.

"Upper Hand" possui uma introdução bastante atmosférica de mais de um minuto e meio feita por sintetizadores e guitarra até entregar mais uma peça em ritmo lento. Os floreios de guitarra solo são belíssimos e exemplificam exatamente o que eu disse na faixa anterior. "Waiting For Stevie" me fez sentir uma grande “vibração grunge” encontrada em discos – da banda ou não – da primeira metade dos aos 90. Talvez a produção mais polida possa atrapalhar um pouco essa percepção, mas basta se concentrar e perceber que o grunge clássico, digamos assim, está ali.

"Running" é outro dos momentos mais pesados do disco. Assim que começou foi impossível não lembrar de Rearviewmirror, clássica faixa do disco VS. Possui a melhor seção rítmica do álbum e alguns dos vocais mais raivosos. As guitarras como sempre soam perfeitas, tanto nos riffs quanto nos solos. "Something Special", após a “violência” da faixa anterior, tudo suaviza de novo por meio de uma peça em que Vedder faz um aceno para as suas filhas. Nota-se uma boa influência na música country moderna.

"Got To Give" é um daqueles velhos exemplos em que o básico pode funcionar muito bem, um rock and roll direto e objetivo que apresenta uma abordagem clássica que é ao mesmo tempo empolgante e envolvente. O acréscimo de algumas linhas de piano encaixou muito bem. "Setting Sun" é a faixa de encerramento. Novamente há uma boa vibração country e entrega um fechar de cortinas extremamente aconchegante para o disco.

Dark Matter apresenta um Pearl Jam confiante e com uma sonoridade totalmente própria e característica. A banda demonstra que embora valorize suas raízes e tenha respeito por sua história, não deixa de buscar novas perspectivas em sua arte. No mais novo capítulo de sua história, a banda entrega uma celebração da sua identidade e que tem a capacidade ressoar positivamente tanto nos fãs de longa data, quanto com novas gerações de ouvintes.

NOTA: 7,2/10

Gênero: Rock Alternativo, Hard Rock

Faixas:

1. Scared of Fear – 4:24
2. React, Respond – 3:30
3. Wreckage – 5:00
4. Dark Matter – 3:31
5. Won't Tell – 3:28
6. Upper Hand – 5:57
7. Waiting for Stevie – 5:41
8. Running – 2:19
9. Something Special – 4:06
10. Got to Give – 4:37
11. Setting Sun – 5:43

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The Weather Station - Humanhood (2025)

                                       

The Weather Station é um projeto liderado pela canadense Tamara Lindeman. Suas composições se destacam pela profundidade com que são explorados temas diversos muitas vezes dentro da complexidade envolta das nossas emoções. Combinando letras introspectivas e poéticas com melodias atmosféricas e bem construídas, o projeto apresenta arranjos muito bem elaborados que transitam entre o folk tradicional, indie rock e até mesmo algumas nuances jazzísticas que juntos criam dessa forma uma sonoridade envolvente.

O projeto ao longo dos anos passou por uma clara evolução. Enquanto os primeiros álbuns apresentavam um estilo mais acústico e enraizado no folk tradicional, os trabalhos mais recentes entregam uma abordagem mais expansiva. Com o álbum "Ignorance" (2021), Tamara trouxe uma transformação sônica ao incorporar elementos de art pop e jazz que ampliaram a sonoridade do projeto. Instrumentos como cordas, teclados e saxofones são utilizados na construção de paisagens sonoras sofisticadas que enriquecem as narrativas de suas letras. 

Coproduzido por Lindeman e o seu experiente parceiro musical Marcus Paquin, Humanhood álbum foi gravado ainda em 2023 trazendo consigo uma sonoridade cheia de sofisticação dentro de uma fusão rica de pop, folk, indie rock, jazz e música ambiente, criando dessa forma uma experiência sonora que é ao mesmo tempo expansiva e intimista. A atmosfera do álbum é amplificada pelo uso de arranjos texturizados e bastante detalhados que possuem a capacidade de evocar tanto vulnerabilidade quanto força.

“Descent" abre o álbum com uma introdução instrumental breve e atmosférica. Apresenta um arranjo minimalista de flauta e uma melodia etérea que sugere introspecção e mistério. "Neon Signs" surge de forma orgânica mantendo a batida deixada por "Descent", como se ambas as faixas estivessem conectadas em um fluxo contínuo. A música entrega uma mescla de indie rock e pop atmosférico com uma batida de ritmo ininterrupto, enquanto isso, os sintetizadores criam uma paisagem sonora envolvente e as guitarras apesar de discretas adicionam belas camadas. 

“Mirror” é uma das faixas mais sofisticadas do disco, oferecendo uma instrumentação muito bem cuidada e excelente atmosfera. Traz alguns elementos de jazz contemporâneo que adicionam tanto profundidade quanto complexidade à música. A bateria é fluida e discreta e os “ataques” de saxofone feitos de maneira orgânica em momentos pontuais adicionam um charme especial. "Window" se constrói sobre uma batida sólida e cadenciada com uma percussão bem pronunciada que confere à música um impulso contínuo, como se estivesse empurrando o ouvinte para frente. A batida não apenas dá movimento à música, mas também a coloca em um território mais rítmico, enquanto sua letra parece capturar o momento exato em que alguém toma coragem para abandonar uma situação sufocante.

“Passage” é um pequeno interlúdio instrumental de menos de um minuto baseado em texturas eletrônicas ambientais. "Body Moves" é uma faixa que se sustenta em um groove ritmado e dançante. Possui algumas linhas profundas e marcantes de baixo que dão à música uma base sólida e cheia de ritmo. Possui uma influência de funk que adiciona um dinamismo contagiante que faz a música remeter imediatamente ao desejo de movimento e dança. Inclusive, o vídeo oficial é apenas uma câmera focada em Tamara realizando alguns leves movimentos. 

"Ribbon" é uma composição acústica que se destaca pela sua simplicidade e delicadeza. A faixa possui um arranjo sutil de piano que cria uma atmosfera íntima e introspectiva. À medida que avança, sua sonoridade vai se expandindo e conferindo à faixa uma qualidade onde cada acorde soa como se estivesse sendo cuidadosamente projetado para evocar uma emoção profunda. “Fleuve”, com pouco mais de um minuto, é mais um interlúdio que nasce e termina por meio das mesmas notas de piano deixado pela faixa anterior.

"Humanhood", a faixa-título é uma fusão que combina muito bem elementos de folk e jazz, criando desta forma uma sonoridade quase sedutora. A base da música é construída por arranjos de sopro que adicionam uma textura rica e fluida, enquanto a bateria mantém uma sensação de introspecção, mais ou menos como uma espécie de compasso reflexivo e que convida o ouvinte a mergulhar na música.

"Irreversible Damage" é uma faixa mais sombria e melancólica que possui uma enorme profundidade emocional que transborda de cada acorde. O contrabaixo acústico entrega algumas linhas expressivas que parecem refletir a densidade do sentimento da música, enquanto a bateria cria uma textura sonora que permite que cada elemento respire e se desenvolva perfeitamente. A forma que os instrumentos interagem entrega uma forte influência no jazz contemporâneo. 

"Lonely" é uma balada de arranjo minimalista e que permite que a sua emotividade se manifeste de forma pura e direta. Uma seção rítmica de notas delicadas e espaçadas cria uma sensação de solidão e cura emocional – que são os seus temas líricos. Leves sintetizadores atmosféricos preenchem o espaço com sutileza e mostram um exemplo claro de uma música que se constrói dentro de um equilíbrio perfeito entre o silêncio e a expressão. 

"Aurora" é o terceiro interlúdio do álbum, uma peça etérea de pouco mais de um minuto e meio que funciona como uma pausa meditativa.  É uma interação delicada entre o piano e a flauta que trocam melodias suaves em um diálogo introspectivo. A sonoridade atmosférica do sintetizador preenche o fundo suavemente. 

"Sewing" é a música de encerramento. Começa com uma bateria solitária, mas logo em seguida o piano entra suavemente acompanhando a voz delicada de Tamara que flui com leveza e serenidade, dando à música uma sensação de intimidade e fragilidade. Uma flauta surge de forma suave, como um abraço musical que envolve o ouvinte, então que um som ao fundo vai crescendo gradualmente e cria uma tensão que permeia o ambiente até silenciar repentinamente, deixando a música segue por meio de piano e voz até terminar. 

Apesar de suas abordagens cruas, introspectivas e profundas, Humanhood oferece uma visão sensível e verdadeira sobre temas universais como solidão, identidade, desilusão, amor e desejo, tudo isso dentro de uma musicalidade que se destaca pela sofisticação dos arranjos que combinam elementos de folk, jazz, pop e música ambiente de forma fluida e envolvente, enquanto que as interpretações emocionais de Tamara Lindeman transmitem uma vulnerabilidade que dá vida a cada palavra e nota. 

Por fim, Humanhood não é apenas uma coleção de músicas, ele também é uma jornada dramática e comovente que vai além da superfície ao convidar o ouvinte a refletir sobre sua própria humanidade, suas contradições e as complexidades do que significa ser verdadeiramente humano. 

NOTA: 9/10

Gênero: Art Pop, Art Rock

Faixas:

1. Descent - 1:00
2. Neon Signs - 5:07
3. Mirror - 4:56
4. Window - 2:41
5. Passage 0:48
6. Body Moves - 3:27
7. Ribbon - 3:18
8. Fleuve - 1:10
9.Humanhood - 4:11
10. Irreversible Damage - 5:36
11. Lonely - 4:36
12. Aurora - 1:37
13. Sewing - 5:58

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terça-feira, 28 de janeiro de 2025

50 anos de: Toys In the Attic - Aerosmith (1975)

                         

Combinando um som cru e energético com um maior requinte em suas composições o terceiro álbum de estúdio do Aerosmith é um marco não apenas na carreira do grupo, mas também na história do rock. Toys In the Attic representou um salto significativo para a banda tanto em termos de sucesso comercial, quanto artístico ao desempenhar um papel importante na consolidação do Aerosmith como uma das maiores forças do rock durante os anos 1970.

Na época do lançamento, o grupo vivia uma transição tanto em termos de sua posição na indústria musical, quanto em suas dinâmicas internas. Apesar de a banda não ter passado despercebida nos dois primeiros discos, principalmente devido ao relativo sucesso alcançado por “Dream On” do seu disco de estreia, seu sucesso foi discreto e os músicos se sentiam incomodados pelo rótulo de “apenas mais uma banda de blues rock" que os críticos e o próprio público haviam lhes colocado, afinal, isso ajudava para que eles figurassem apenas na sombra de bandas já muito bem estabelecidas como Led Zeppelin e Rolling Stones. 

O ambiente em que o álbum foi concebido pode ser definido como uma mistura de pressão, ambição e um espírito criativo em efervescência. A banda se arriscou mais e explorou novos territórios sonoros, o que obviamente elevou a sofisticação de suas composições ao mesmo tempo em que manteve a energia bruta que os caracterizava. O grupo trabalhou incansavelmente para transformar ideias cruas em músicas que fossem ao mesmo tempo acessíveis e ousadas. 

Vale destacar também a presença de Jack Douglas como produtor, afinal, foi um fator essencial para o sucesso do álbum. Ele já havia trabalhado com a banda em Get Your Wings, porém, foi em Toys in the Attic que sua parceria com o Aerosmith atingiu seu auge. Douglas atuava quase como um sexto membro da banda e conseguiu extrair o melhor de cada integrante ao traduzir sua energia caótica em gravações que ainda pareciam espontâneas e vivas. Ao mesmo tempo ele sabia quando desafiar a banda a ajudando a expandir suas fronteiras musicais e incorporar influências externas, como, o funk, de uma maneira que soasse natural.

A faixa-título, que abre o álbum por meio de uma explosão de energia pura, estabelece o tom para tudo que vem a seguir. Desde o primeiro riff frenético a música mergulha o ouvinte em um turbilhão de intensidade e atitude e deixa claro que desta vez o Aerosmith estava ali para marcar território. Essa base instrumental se entrelaça de uma maneira perfeitamente harmônica com os vocais de Tyler que soam cheios de força e irreverência. 

“Uncle Salty” é uma faixa que adota um ritmo mais lento e introspectivo, sendo marcada por um groove pesado e uma atmosfera mais sombria. A linha de baixo é um dos destaques ao estabelecer o tom da canção. O riff de guitarra é bastante simples e mesmo assim memorável. Os vocais de Tyler reforçado por harmonias bem trabalhadas adicionam profundidade e emoção. Sem dúvida é uma peça que evidencia o lado mais reflexivo do Aerosmith. 

“Adam’s Apple” é uma faixa que mistura o rock clássico com uma vibração funky, o que resulta em uma composição cheia de energia e descontração. O riff principal possui um groove natural que prende o ouvinte. Embora as guitarras tragam um toque de blues característico, a estrutura ágil da música confere a ela um dinamismo que a mantém envolvente. Joe Perry brilha ao adicionar licks melódicos e um solo cheio de slides e bends. 

“Walk This Way”, seu riff principal se tornou um dos mais reconhecíveis e icônicos da história do rock. Possui uma combinação de elementos de funk e blues com uma estrutura rítmica precisa e técnica. O riff traz uma energia contagiante que imediatamente prende a atenção do ouvinte, mas que ganha mais força com uma seção rítmica sólida. É a definição de uma faixa que consegue mesclar técnica e vibração com todos da banda trabalhando juntos para criar uma sonoridade que é precisa e cheia de alma. 

“Big Ten Inch Record” é um tributo carismático ao blues e ao jump blues das décadas de 1940 e 1950. Possui uma vibe mais leve e descontraída em comparação com outras músicas do álbum. O uso do saxofone é um elemento chave que confere à faixa uma textura jazzística e traz uma nuance de sofisticação ao disco. Interessante ver como a banda se permite explorar um lado mais lúdico e menos pesado, mas sem perder a autenticidade ou o charme que caracteriza o grupo.

“No More No More” é uma faixa que captura perfeitamente o espírito clássico do rock and roll. O riff principal com sua estrutura dinâmica alterna entre seções mais suaves nos versos e explosões de energia nos refrãos, criando assim, um contraste marcante. É uma prova do talento coletivo da banda ao mostrar uma habilidade impressionante para criar um som que é simultaneamente vigoroso e refinado. Minha música preferida do disco.

“Round and Round” é a faixa mais pesada do disco e contrasta intensamente com o restante do álbum. Desde o início a música se destaca por seu clima sombrio que remete ao Black Sabbath e que é estabelecido por riffs lentos e graves. A linha de baixo é pulsante e profunda, enquanto a bateria se desenvolve de forma arrastada, reforçando ainda mais a tonalidade densa e introspectiva da música. É um claro exemplo em que a banda quer mostrar sua capacidade de explorar territórios mais sombrios. 

“You See Me Crying” é a peça de encerramento, uma balada bastante dramática e que destaca o lado mais emocional da banda. É construída principalmente em torno de um piano expressivo de tom melancólico e introspectivo. Os arranjos orquestrais adicionam uma camada que enriquece ainda mais à música. As guitarras desempenham um papel mais sutil. Mas Tyler é quem rouba a cena por meio de uma performance visceral em que alcança notas altíssimas com uma carga emocional impressionante. Um belíssimo final de disco. 

Toys in the Attic não apenas solidificou o Aerosmith como uma das maiores bandas de rock da história, mas também definiu um momento crucial para o gênero ao elevar o hard rock a novos patamares. O álbum marcou um ponto de virada na carreira da banda e consolidou sua identidade musical provando sua capacidade de inovar dentro do cenário musical competitivo da época. O álbum também destacou a química entre Steven Tyler e Joe Perry, estabelecendo-os como uma das duplas mais icônicas e dinâmicas do rock. 

Musicalmente, Toys in the Attic é um álbum incrivelmente diversificado e que se destaca por explorar uma ampla gama de estilos como hard rock, blues, funk e até elementos de jazz, além da utilização da música orquestral. Essa fusão reflete não apenas a habilidade técnica da banda, mas também sua disposição de experimentar e expandir os limites do rock tradicional, com cada uma das faixas do disco apresentando nuances únicas por meio das guitarras marcantes de Perry, os vocais poderosos e emocionais de Tyler e a sólida seção rítmica formada pelo baixo de Tom Hamilton e a bateria de Joey Kramer, que trabalham em harmonia para capturar a energia crua e autêntica da grupo em um álbum que encapsula o espírito de uma era enquanto permanece eternamente relevante.

NOTA: 10/10

Gênero: Hard Rock

Faixas:

1. Toys in the Attic - 3:05
2. Uncle Salty - 4:08
3. Adam's Apple - 4:34
4. Walk This Way - 3:39
5. Big Ten Inch Record - 2:10
6. Sweet Emotion - 4:34
7. No More No More - 4:35
8. Round and Round - 5:02
9. You See Me Crying - 5:12

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segunda-feira, 27 de janeiro de 2025

Soniq Circus - Cursed Cruise (2025)

                       

Soniq Circus é uma banda sueca que tem em sua característica uma fusão envolvente de influências que incluem o rock progressivo clássico, sendo influenciados por bandas como Genesis, King Crimson e Rush e o metal progressivo de bandas como Dream Theater e Opeth, que acrescenta uma dose de complexidade técnica e atmosferas densas. A banda explora dinâmicas instrumentais sofisticadas, passagens harmônicas e mudanças de tempo, mas sempre buscando equilibrar a acessibilidade das melodias com a profundidade das composições. Essa mistura de influências cria uma sonoridade envolvente capaz de agradar tanto os fãs de rock progressivo tradicional e clássico quanto os apreciadores do metal progressivo e sua tecnicidade. 

Apesar de dois discos de estreia promissores, Soniq Circus (2007) e Reflections in the Hourglass (2011), foi em 2025 que a banda realmente alcançou seu grande feito com o lançamento de Cursed Cruise. Nesse álbum o grupo demonstrou uma evolução impressionante, não apenas aprimorando seu som, mas também explorando novas possibilidades dentro do rock progressivo de maneira extremamente criativa.

Em Cursed Cruise a banda conseguiu integrar suas influências do progressivo clássico e metal progressivo entregando uma sonoridade fresca e contemporânea. A produção do álbum trouxe uma mistura de elementos inesperados, como, por exemplo, o uso mais ousado de improvisação enquanto mantinham a complexidade técnica que caracteriza o gênero. O disco se destaca por sua capacidade de levar o rock progressivo moderno a um tipo de lugar capaz de capturar tanto os fãs mais tradicionais quanto os ouvintes em busca de algo diferente dentro da cena atual. 

“Unbegun" é a peça de abertura e desempenha um papel fundamental na definição da atmosfera e do tom do álbum. Totalmente instrumental, a faixa tem uma combinação de elementos pesados e sutis. A música se destaca por suas variações dinâmicas que incluem riffs agressivos e pacíficos de guitarra, uma seção rítmica bem construída por um baixo firme e uma bateria que cria um groove envolvente, enquanto os teclados oferecem uma camada sinfônica que adiciona profundidade à música.

“Let the Game Begin” é o épico do disco, ultrapassando os 16 minutos de duração. Uma música que explora uma vasta gama de paisagens sonoras ao mergulhar em trechos de metal progressivo nos momentos pesados e agressivos, e que são alternados com um rock progressivo sinfônico que cria um equilíbrio perfeito entre complexidade e melodia. A guitarra e o teclado estão sempre se entrelaçando de forma dinâmica, enquanto a seção rítmica sólida serve de alicerce para as variações mais ousadas e as transições que a faixa necessita pra funcionar bem. Mesmo em passagens mais tranquilas, onde a instrumentação se torna mais contida e os vocais se tornam mais melódicos e delicados, a música mantém uma tensão que prepara o terreno para a retomada das seções mais intensas.

Vale destacar também a habilidade de “Let the Game Begin” em fluir sem perder a coesão apesar das várias mudanças de andamento e estilo. A peça sabe exatamente quando explorar cada um desses momentos e como conectá-los de uma forma orgânica. Cada seção tem seu propósito claro dentro do contexto da música e a transição entre elas nunca parece forçada, onde mesmo com as variações no ritmo e nas texturas a faixa permanece bem direcionada.

"Cold Water" abre com um riff robusto e marcante de guitarra que imediatamente estabelece uma atmosfera poderosa e envolvente, então que o restante dos instrumentos se junta a ela e a sonoridade se transforma em uma parede de som pesada e cheia de intensidade com destaque para solo de teclado. Conforme a música avança a banda equilibra o peso inicial com uma transição para uma linha mais melódica e que se torna o coração da canção, mostrando dessa forma a capacidade da banda de mesclar força e sensibilidade de maneira fluida.

"The Quarrel" abre com uma sonoridade que remete à uma trilha sonora de um filme de guerra em um de seus momentos mais tensos, dramáticos e que evocam imagens de conflitos épicos. Então que a banda se alterna entre momentos de peso e intensidade, onde guitarras e bateria assumem o protagonismo, mas sendo sustentados por arranjos sinfônicos, porém, mesmo nas partes mais pesadas, os teclados permanecem presentes e marcantes, adicionando uma textura rica que complementa a densidade instrumental.

"The I of The Storm" representa uma clara influência do neo progressivo ao estilo de bandas como IQ por meio de passagens melódicas e atmosféricas, mas também incorpora o peso e a complexidade técnica características do Dream Theater, equilibrando momentos introspectivos e explosões de energia. Os vocais em particular remetem ao estilo de James LaBrie, com linhas emocionais e potentes que se destacam ao longo da música.

"The Accident" é mais uma demonstração clara da habilidade da banda em criar músicas onde o equilíbrio entre os instrumentos é o verdadeiro destaque. Guitarra, teclado, bateria e baixo trabalham em perfeita harmonia criando uma sonoridade bastante coesa. A guitarra oferece riffs e melodias que guiam a faixa com fluidez, além de um belo solo na parte final, enquanto os teclados adicionam camadas de profundidade inserindo um toque atmosférico à composição, por fim, a bateria e o baixo criam a seção rítmica e melódica garantindo que tudo se encaixe bem. 

"Achilles Down" inicia por meio de um piano delicado e que evoca um clima introspectivo e emocional que acaba sugerindo a possibilidade de uma balada. No entanto, a peça se transforma, onde ao longo dos seus quase 8 minutos, as mudanças de direção são uma constante, porém, novamente a banda demonstra grande domínio técnico e criativo ao explorar diferentes atmosferas e ritmos sem que em momento algum ela pareça dispersa.

“In Metal Rust” é outra música completamente instrumental. Começa por meio de uma sonoridade atmosférica antes de se tornar um dos momentos mais pesados do disco, seguindo assim até pouco mais da metade, quando um piano cria uma espécie de antes e depois, com isso, a banda entre em uma sonoridade mais melódica sob um excelente solo de guitarra até que o tema pesado inicial retorne antes da peça terminar.  

"Cagnazzo" inicia com um arpejo de guitarra que estabelece uma base introspectiva. A partir daí, a faixa se desenvolve com uma instrumentação rica, incluindo a inserção pontual de trompetes que adicionam uma camada de sofisticação e um toque inesperado à sonoridade. A guitarra assume um papel mais discreto e permite que os teclados se destaquem com arranjos criativos e texturas variadas. A seção rítmica mantém sua precisão ao proporcionar uma base estável. Os vocais também se destacam e usam de uma entrega emocional e intensa chegando a soar teatral em determinados momentos.

"In the End", com pouco mais de dois minutos de duração é a faixa mais curta do disco, mas sua brevidade não diminui sua força. A música segue uma linha predominantemente acústica, com violões criando uma base delicada e intimista que se destaca por sua simplicidade, sendo enriquecida por orquestrações suaves dos teclados. Ainda há espaço para um solo de guitarra elegante e emocional que complementa o clima introspectivo.

"The Last Casualty" é a música que finaliza o disco e se destaca por sua sonoridade mais otimista, algo que parece ter sido feito de forma proposital. A composição carrega uma leveza que contrasta com a intensidade emocional presente em grande parte do álbum, funcionando quase como um alívio após uma jornada sônica mais complexa. Embora seja uma das faixas mais simples, sua instrumentação é belíssima, com a banda optando por um arranjo mais direto, onde cada instrumento trabalha de maneira precisa, equilibrada e sem exageros. 

Em um mundo cada vez mais imediatista e que a atenção do público mesmo entre fãs de rock progressivo parece favorecer obras mais compactas, um disco de 72 minutos talvez seja encarado inicialmente como um desafio. No entanto, Cursed Cruise prova que ainda é possível entregar uma obra longa que não apenas mantém a coesão, mas também faz cada minuto valer a pena. Um disco de sonoridade bem estruturada com cada faixa contribuindo para a narrativa musical geral, onde nada soa supérfluo ou deslocado e tudo tem um propósito. 

NOTA: 9/10

Gênero: Rock Progressivo

Faixas:

1. Unbegun - 6:00
2. Let the Game Begin - 16:24
3. Cold Water - 4:27
4. The Quarrel - 6:48
5. The I of the Storm - 3:55
6. The Accident - 8:30
7. Achilles Down - 7:54
8. In Mental Rust - 5:23
9. Cagnazzo - 6:00
10. In the End - 2:12
11. The Last Casualty - 4:24

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60 anos de: A Love Supreme - John Coltrane (1965)

                        Com certeza que A Love Supreme é um dos álbuns mais brilhantes da história do jazz instrumental e ao mesmo tempo uma...