Combinando um som cru e energético com um maior requinte em suas composições o terceiro álbum de estúdio do Aerosmith é um marco não apenas na carreira do grupo, mas também na história do rock. Toys In the Attic representou um salto significativo para a banda tanto em termos de sucesso comercial, quanto artístico ao desempenhar um papel importante na consolidação do Aerosmith como uma das maiores forças do rock durante os anos 1970.
Na época do lançamento, o grupo vivia uma transição tanto em termos de sua posição na indústria musical, quanto em suas dinâmicas internas. Apesar de a banda não ter passado despercebida nos dois primeiros discos, principalmente devido ao relativo sucesso alcançado por “Dream On” do seu disco de estreia, seu sucesso foi discreto e os músicos se sentiam incomodados pelo rótulo de “apenas mais uma banda de blues rock" que os críticos e o próprio público haviam lhes colocado, afinal, isso ajudava para que eles figurassem apenas na sombra de bandas já muito bem estabelecidas como Led Zeppelin e Rolling Stones.
O ambiente em que o álbum foi concebido pode ser definido como uma mistura de pressão, ambição e um espírito criativo em efervescência. A banda se arriscou mais e explorou novos territórios sonoros, o que obviamente elevou a sofisticação de suas composições ao mesmo tempo em que manteve a energia bruta que os caracterizava. O grupo trabalhou incansavelmente para transformar ideias cruas em músicas que fossem ao mesmo tempo acessíveis e ousadas.
Vale destacar também a presença de Jack Douglas como produtor, afinal, foi um fator essencial para o sucesso do álbum. Ele já havia trabalhado com a banda em Get Your Wings, porém, foi em Toys in the Attic que sua parceria com o Aerosmith atingiu seu auge. Douglas atuava quase como um sexto membro da banda e conseguiu extrair o melhor de cada integrante ao traduzir sua energia caótica em gravações que ainda pareciam espontâneas e vivas. Ao mesmo tempo ele sabia quando desafiar a banda a ajudando a expandir suas fronteiras musicais e incorporar influências externas, como, o funk, de uma maneira que soasse natural.
A faixa-título, que abre o álbum por meio de uma explosão de energia pura, estabelece o tom para tudo que vem a seguir. Desde o primeiro riff frenético a música mergulha o ouvinte em um turbilhão de intensidade e atitude e deixa claro que desta vez o Aerosmith estava ali para marcar território. Essa base instrumental se entrelaça de uma maneira perfeitamente harmônica com os vocais de Tyler que soam cheios de força e irreverência.
“Uncle Salty” é uma faixa que adota um ritmo mais lento e introspectivo, sendo marcada por um groove pesado e uma atmosfera mais sombria. A linha de baixo é um dos destaques ao estabelecer o tom da canção. O riff de guitarra é bastante simples e mesmo assim memorável. Os vocais de Tyler reforçado por harmonias bem trabalhadas adicionam profundidade e emoção. Sem dúvida é uma peça que evidencia o lado mais reflexivo do Aerosmith.
“Adam’s Apple” é uma faixa que mistura o rock clássico com uma vibração funky, o que resulta em uma composição cheia de energia e descontração. O riff principal possui um groove natural que prende o ouvinte. Embora as guitarras tragam um toque de blues característico, a estrutura ágil da música confere a ela um dinamismo que a mantém envolvente. Joe Perry brilha ao adicionar licks melódicos e um solo cheio de slides e bends.
“Walk This Way”, seu riff principal se tornou um dos mais reconhecíveis e icônicos da história do rock. Possui uma combinação de elementos de funk e blues com uma estrutura rítmica precisa e técnica. O riff traz uma energia contagiante que imediatamente prende a atenção do ouvinte, mas que ganha mais força com uma seção rítmica sólida. É a definição de uma faixa que consegue mesclar técnica e vibração com todos da banda trabalhando juntos para criar uma sonoridade que é precisa e cheia de alma.
“Big Ten Inch Record” é um tributo carismático ao blues e ao jump blues das décadas de 1940 e 1950. Possui uma vibe mais leve e descontraída em comparação com outras músicas do álbum. O uso do saxofone é um elemento chave que confere à faixa uma textura jazzística e traz uma nuance de sofisticação ao disco. Interessante ver como a banda se permite explorar um lado mais lúdico e menos pesado, mas sem perder a autenticidade ou o charme que caracteriza o grupo.
“No More No More” é uma faixa que captura perfeitamente o espírito clássico do rock and roll. O riff principal com sua estrutura dinâmica alterna entre seções mais suaves nos versos e explosões de energia nos refrãos, criando assim, um contraste marcante. É uma prova do talento coletivo da banda ao mostrar uma habilidade impressionante para criar um som que é simultaneamente vigoroso e refinado. Minha música preferida do disco.
“Round and Round” é a faixa mais pesada do disco e contrasta intensamente com o restante do álbum. Desde o início a música se destaca por seu clima sombrio que remete ao Black Sabbath e que é estabelecido por riffs lentos e graves. A linha de baixo é pulsante e profunda, enquanto a bateria se desenvolve de forma arrastada, reforçando ainda mais a tonalidade densa e introspectiva da música. É um claro exemplo em que a banda quer mostrar sua capacidade de explorar territórios mais sombrios.
“You See Me Crying” é a peça de encerramento, uma balada bastante dramática e que destaca o lado mais emocional da banda. É construída principalmente em torno de um piano expressivo de tom melancólico e introspectivo. Os arranjos orquestrais adicionam uma camada que enriquece ainda mais à música. As guitarras desempenham um papel mais sutil. Mas Tyler é quem rouba a cena por meio de uma performance visceral em que alcança notas altíssimas com uma carga emocional impressionante. Um belíssimo final de disco.
Toys in the Attic não apenas solidificou o Aerosmith como uma das maiores bandas de rock da história, mas também definiu um momento crucial para o gênero ao elevar o hard rock a novos patamares. O álbum marcou um ponto de virada na carreira da banda e consolidou sua identidade musical provando sua capacidade de inovar dentro do cenário musical competitivo da época. O álbum também destacou a química entre Steven Tyler e Joe Perry, estabelecendo-os como uma das duplas mais icônicas e dinâmicas do rock.
Musicalmente, Toys in the Attic é um álbum incrivelmente diversificado e que se destaca por explorar uma ampla gama de estilos como hard rock, blues, funk e até elementos de jazz, além da utilização da música orquestral. Essa fusão reflete não apenas a habilidade técnica da banda, mas também sua disposição de experimentar e expandir os limites do rock tradicional, com cada uma das faixas do disco apresentando nuances únicas por meio das guitarras marcantes de Perry, os vocais poderosos e emocionais de Tyler e a sólida seção rítmica formada pelo baixo de Tom Hamilton e a bateria de Joey Kramer, que trabalham em harmonia para capturar a energia crua e autêntica da grupo em um álbum que encapsula o espírito de uma era enquanto permanece eternamente relevante.
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