Misplaced Childhood é para muitos o ponto alto não só da era Fish, mas de toda a discografia do Marillion. Este álbum é um exemplo claro de como a música progressiva pode fluir de forma coesa e com linhas melódicas excepcionais, além de uma musicalidade refinada e uma narrativa poderosa que é ao mesmo tempo acessível a qualquer público. Dentro do universo do neo-progressivo certamente é uma verdadeira obra-prima.
Misplaced Childhood é um álbum conceitual que se destaca por sua estrutura, onde as músicas fluem sem interrupções e formam uma narrativa envolvente. O disco é capaz de capturar emoções profundas e complexas por meio de sua música e letras poéticas que exploram uma ampla gama de temas universais, como o amor perdido, a nostalgia, os altos e baixos da fama, as dores emocionais que marcam a existência humana e a esperança de redenção. Reflexões essas muito bem entrelaçadas em uma tapeçaria musical brilhante.
É bastante conhecido que a ideia do disco nasceu de uma experiência profundamente pessoal do vocalista Fish. Foi durante um período de crise emocional que ele teve uma epifania que serviu como ideia para a criação do álbum. Esse momento acabou o inspirando a revisitar memórias de sua infância e a refletir sobre os desafios e desilusões da vida adulta. Muitas das composições são introspectivas e refletem as lutas e os sentimentos do vocalista, trazendo dessa forma, bastante autenticidade e intensidade emocional à cada uma das faixas.
O disco começa com "Pseudo Silk Kimono", uma faixa que estabelece o tom sinfônico e introspectivo do álbum. O teclado melódico acompanhado de uma guitarra sutil e uma linha de baixo profunda cria uma atmosfera suave que é apenas o prelúdio de um disco sensacional. A transição para "Kayleigh" é natural. A música se tornou o maior single da banda ao atingir o segundo lugar nas paradas do Reino Unido. É uma canção direta e sincera sobre a perda de um amor. Inspirada por uma ex-namorada de Fish, é marcada por um groove envolvente e uma combinação perfeita entre bateria e baixo, além de um solo de guitarra memorável que intensifica a emotividade da letra.
"Lavender" segue como uma bela balada, onde Fish reflete sobre o amor através da lente da inocência infantil. A faixa é adornada por melodias edificantes de piano que culminam em um solo de guitarra que amplifica a delicadeza da canção. Em "Bitter Suite" a banda explora o lado sombrio do amor, com Fish recitando um poema sobre uma base musical atmosférica e crescente. A música evolui em uma experiência sombria e introspectiva e de passagens que remetem à sonoridade de "Lavender", destacando a coesão do álbum como um todo. "Heart Of Lothian" é uma ode ao orgulho escocês e à juventude de Fish, sendo uma faixa que brilha como uma das mais emocionantes da banda. Com uma seção rítmica impecável e um solo de guitarra belíssimo, além de Fish em sua melhor forma vocal, a música evoca a influência do Genesis em sua atmosfera rica e emotiva.
"Waterhole (Expresso Bongo)" oferece uma pausa mais curta e intensa, com guitarras estridentes e um riff de sintetizador que energiza a faixa, enquanto "Lords Of The Backstage" mantém o ritmo com uma sincronia impecável entre guitarra e sintetizadores que opreparam o terreno para o épico "Blind Curve". "Blind Curve" é o ápice progressivo do álbum e uma das faixas mais icônicas da banda. A canção começa de maneira direta, com uma linha de guitarra que se funde perfeitamente com os vocais poéticos. Aqui a banda se mostra em seu auge, com uma interação coesa e um equilíbrio perfeito entre todos os instrumentos e que resulta em uma obra etérea e profundamente tocante.
"Childhoods End?" traz um sopro de esperança e oferece uma luz no fim do túnel para o personagem central da narrativa. A faixa é forte, emocional e de estrutura dramática que eleva ainda mais o álbum. "White Feather" fecha o disco com uma melodia simples e animada, embora não tão impactante quanto as faixas anteriores.
Uma obra de arte que não é apenas um disco impecável, mas um disco que definiu o neo-progressivo de forma indiscutível, elevando o padrão de qualidade a alturas raramente alcançadas. Se Misplaced Childhood não for considerado essencial no contexto do neo-progressivo, é difícil imaginar o que mais poderia ser.
NOTA: 10/10
Gênero: Neo-Prog
Faixas:
2. Kayleigh - 4:03
3. Lavender - 2:27
4. Bitter Suite - 5:53
5. Heart of Lothian - 6:02
6. Waterhole (Expresso Bongo) - 2:12
7. Lords of the Backstage - 1:52
8. Blind Curve - 9:29
9. Childhoods End? - 4:32
10. White Feather - 2:23
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